Enquadramento dos Corpos Hídricos e Culturas Irrigáveis na Bacia Hidrográfica do Rio Itajaí

XXV SIMPÓSIO BRASILEIRO DE RECURSOS HIDRÍCOS

Autores: Camila Andréa Ramos; Rubia Girardi João Marcos Bosi Mendonça de Moura

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Resumo

No enquadramento, é levado em consideração os usos pretendidos da água. Para irrigação, cada classe de água possui culturas específicas que podem ou não ser irrigadas. A Bacia Hidrográfica do Rio Itajaí (BHRI), é a única do Estado de Santa Catarina com o enquadramento dos corpos hídricos superficiais aprovado. Nas metas a serem cumpridas nos horizontes para a efetivação do enquadramento, o subprograma 1.3 – 2025 prevê a aferição do tipo de cultura para irrigação a fim de verificar se todos os usuários deste setor estão compatíveis com a classe de qualidade para o horizonte 2025. Assim, o objetivo deste trabalho é verificar se os usos irrigação e aquicultura, cadastrados no sistema de outorga da BHRI estão adequados às classes dos cursos da água. Foram utilizados dados do Cadastro Estadual de Recursos Hídricos de Santa Catarina e do Sistema de Outorga de Água de Santa Catarina (SIOUT), bem como os dados disponíveis do programa de efetivação do enquadramento, com a meta de qualidade para 2025. Foram identificados usuários de água para irrigação que captam água em trechos de rio classe 2 e 3. A maioria das culturas predominantes na BHRI não podem ser irrigadas com água oriunda de trechos classe 3, devido a sua qualidade. Assim, existe um grande potencial de usuários de água para irrigação estarem irregulares. Quanto aos usuários de classe 2,

Palavras-Chave: Classes da água, programa de efetivação do enquadramento, Bacia do Itajaí.

Introdução

A Resolução CONAMA 397/05 e alterações dispõem sobre a classificação dos corpos de água e diretrizes ambientais para o seu enquadramento, levando em consideração os usos de água pretendidos. Cada classe de água doce (classe especial, classe 1, classe 2, classe 3 e classe 4) possui culturas específicas que podem ou não ser irrigadas, de acordo com a classe.

A Resolução do Conselho Estadual de Recursos Hídricos de Santa Catarina nº 69/2022 aprova o enquadramento dos corpos de água superficiais da Unidade de Planejamento e Gestão (UPG) 7.1 Itajaí em classes, segundo os usos preponderantes, e apresenta as metas a serem cumpridas nos horizontes para a efetivação do enquadramento. A resolução apresenta os programas de efetivação para as metas propostas para os anos de 2025, 2030, 2035 e 2040. O programa 1 é referente às metas para 2025, e está dividido em 3 subprogramas. Cada subprograma apresenta ações a serem cumpridas para atingir a meta de efetivação do enquadramento.

O subprograma 1.3-2025 (referente à gestão ambiental) prevê a aferição do tipo de cultura para irrigação a fim de verificar se todos os usuários deste setor estão compatíveis com a classe de qualidade para o horizonte 2025. Assim, o objetivo deste trabalho é verificar se os usos irrigação e aquicultura, cadastrados no sistema de outorga na Bacia do Itajaí estão adequados às classes dos cursos da água.

Metodologia

Área de Estudo

A área de estudo é a Bacia Hidrográfica do Rio Itajaí (BHRI), situada no norte do Estado de Santa Catarina. Sua área de drenagem é de cerca de 15.000 km2 abrangendo 52 municípios. A BHRI é dividida em sub-bacias hidrográficas, também definidas como unidades de gestão. As principais são: Itajaí do Sul, Itajaí do Oeste, Itajaí do Norte ou Rio Hercílio, Rio Benedito, Rio Luiz Alves, Rio Itajaí-Mirim e Rio Itajaí-Açu.

(Recomenda-se inserir a Figura 1 aqui – Mapa das Sub-bacias Hidrográficas do Rio Itajaí)

Análise de Compatibilidade de Classe do Enquadramento e Culturas

Para avaliar se o uso para irrigação é compatível com a meta de qualidade para o horizonte 2025, foram utilizados dados do Cadastro Estadual de Recursos Hídricos de Santa Catarina e do Sistema de Outorga de Água de Santa Catarina (SIOUT). Os dados foram solicitados à Gerência de Outorga de Recursos Hídricos de Santa Catarina. Os dados utilizados do cadastro são do ano de 2007 até 2021. Também foi utilizado o mapa com a meta de qualidade para 2025, de acordo com a Resolução CERH nº 69/2022.

A Resolução CONAMA nº 395/07 e alterações apresentam quais usos de irrigação podem ser feitos de acordo com a qualidade de água. Para água doce, podem ser utilizadas águas de classe 1 a 3, dependendo da cultura que se pretende irrigar (Quadro 1). Para água salobra, apenas água de qualidade classe 1 pode ser utilizada na irrigação (Quadro 2).

Quadro 1: Água doce para o uso irrigação

  • Classe 1: Irrigação de hortaliças que são consumidas cruas e de frutas que se desenvolvam rentes ao solo e que sejam ingeridas cruas sem remoção de película.
  • Classe 2: Irrigação de hortaliças, plantas frutíferas e de parques, jardins, campos de esporte e lazer; à aquicultura e à atividade de pesca.
  • Classe 3: Irrigação de culturas arbóreas, cerealíferas e forrageiras, à pesca amadora, dessedentação de animais.

Quadro 2: Água salobra para uso irrigação

  • Classe 1: Aquicultura e à atividade de pesca, irrigação de hortaliças que são consumidas cruas e de frutas que se desenvolvam rentes ao solo e que sejam ingeridas cruas sem remoção de película, e à irrigação de parques, jardins, campos de esporte e lazer.

Foi realizado o cruzamento de dados dos trechos do rio para a meta 2025 com os usuários de irrigação que estejam nos trechos do rio com classe 2 e 3 para identificação da cultura e análise do uso. A partir da análise dos dados do CEURH e SIOUT, verificou-se que as coordenadas dos pontos de captação dos usuários são as coordenadas da localização dos empreendimentos. Assim, determinou-se uma faixa de 1 km, em cada margem, ao longo dos trechos de rio enquadrados como classe 2 e classe 3 na meta 2025. Considerou-se que os usuários que estavam nesta faixa são os potenciais usuários desses trechos. Os pontos localizados na união de trechos de classes diferentes foram duplicados por estarem na faixa de 1km de ambas, permanecendo assim em ambas as classes.

No cadastro de uso de água realizado pelo usuário no CEURH e no SIOUT não há discriminação do tipo de cultura que está sendo irrigada, apenas o uso irrigação. Assim, a lista de usuários de irrigação nos trechos de rio classe 2 e 3, classes que possuem restrição de uso para irrigação, foi encaminhada ao órgão gestor de recursos hídricos do Estado de Santa Catarina. Desta forma, é adequado que o órgão gestor solicite ao usuário a discriminação do tipo de cultura que está sendo irrigada e assim será possível averiguar se está de acordo com a classe do trecho onde ocorre a captação. Para fins de discussão deste trabalho, utilizou-se dados secundários da literatura sobre as culturas mais abundantes da Bacia Hidrográfica do Rio Itajaí, especialmente dos municípios que foram identificados.

Resultados e Discussão

Água Doce – Identificação dos Usuários de Irrigação para as Classes 2 e 3

Nos dados do CEURH e SIOUT de Santa Catarina, dos 50 municípios, 46 municípios possuem dados de usuários para irrigação. Ao todo, para irrigação, são 8767 usuários cadastrados.

Na BHRI, 45 municípios possuem trechos de rio enquadrados como classe 3 para a meta 2025, para água doce. Para trechos do rio enquadrados como classe 2 para a meta 2025, água doce, são 18 municípios. Ao todo somam-se 46 municípios que possuem trechos de rio classificados como classe 2 ou 3.

Do total de 8767 usuários cadastrados para o uso irrigação, 20,05% (1785 usuários) estão na distância de 1 km dos trechos de rio classe 3 (Figura 2). Portanto, podem estar usando esta água para irrigação. Em relação aos trechos de rio classe 2 (Figura 3), 5,57% (489 usuários) estão na distância de 1 km e podem estar usando esta água para irrigação.

Água Doce – Avaliação da Compatibilidade do Uso Irrigação – Classe 3

Na BHRI, entre as principais culturas com lavouras temporárias e permanentes destacam-se o cultivo do fumo (40,5%), arroz (31,3%), cebola (13,2%), mandioca (4,5%) e banana (10,5%), representando em torno de 102.152 ha de área cultivada na bacia. Dentre estas principais culturas, apenas o arroz (cereal) poderia ser irrigado com água oriunda de trechos classificados como classe 3. Mandioca e cebola são hortaliças, banana é fruta e o fumo é considerado uma planta herbácea à subarbustiva.

Quarenta municípios possuem usuários de água para irrigação em trechos classificados como classe 3. Destes, os municípios que apresentam maior número de usuários são: Rio do Oeste (341 usuários), Alfredo Wagner (222 usuários), Taió (182 usuários), Pouso Redondo (128 usuários), Agronômica (71 usuários), Ituporanga (71 usuários).

Esses seis municípios representam mais de 50% dos usuários em trechos de rio classe 3. Das culturas mais abundantes, apenas arroz e milho podem ser irrigadas com água de trechos de rio classe 3. Todas as demais culturas de destaque nesses municípios (fumo, citricultura, mandioca, feijão, cebola, batata-salsa e demais hortaliças) não são compatíveis com a classe 3 para irrigação (Quadro 1).

Água Doce – Avaliação da Compatibilidade do Uso Irrigação – Classe 2

Por possuírem melhor qualidade de água, os corpos hídricos classificados como classe 2 são menos restritivos quanto aos usos de água do que os de classe 3. Podem ser utilizados para irrigação de culturas arbóreas, cerealíferas, forrageiras, hortaliças (exceto aquelas que são consumidas cruas), e irrigação de plantas frutíferas menos as frutas que se desenvolvam rentes ao solo e que sejam ingeridas cruas sem remoção de película.

Quinze municípios possuem usuários de água para irrigação em trechos classificados como classe 2. Destes, os municípios que apresentam maior número de usuários são: Mirim Doce (174 usuários), Ituporanga (141 usuários) e Rio dos Cedros (57 usuários). As culturas de arroz e cebola, predominantes nos municípios de Mirim Doce, Ituporanga e Rio dos Cedros, podem ser irrigadas com águas classe 2, bem como as principais culturas da Bacia Hidrográfica do Rio Itajaí (fumo, arroz, cebola, mandioca e banana). Porém, ainda assim devem ser analisados os usuários de água que captam água em trechos classe 2, pois apesar de mais abrangente, esta classe também tem restrições: plantas frutíferas que se desenvolvam rentes ao solo e que sejam ingeridas cruas sem remoção de película, como o morango por exemplo, e hortaliças consumidas cruas, como alface e couve. É necessária uma análise de cada usuário, pois nestes trechos classe 2 é possível que haja usuários irregulares.

Água Doce – Usuários de Aquicultura

A partir dos dados do Cadastro Estadual de Usuários de Recursos Hídricos (CEURH) de Santa Catarina, também foi analisado os usuários para fins de aquicultura que estão irregulares perante a Resolução 357 de 2005 e a Resolução CERH-SC 69/2021. Referente a este uso de água, a água doce só pode ser de classe 1 e 2.

De acordo com os dados do CEURH, existem 1362 usuários de água para aquicultura na Bacia Hidrográfica do Rio Itajaí. Para água doce, foram identificados 31 municípios com 303 usuários de água irregulares para este fim (Figura 4). Os usuários que estão captando água de trechos classe 3 estão em desacordo. Os municípios de Ituporanga (44 usuários), Rio dos Cedros (42 usuários) e Trombudo Central (34 usuários) são os que apresentaram maior número de usuários irregulares.

Água Salobra – Avaliação da Compatibilidade do Uso Irrigação e Aquicultura para Água Salobra

Dos municípios da BHRI, apenas Navegantes e Itajaí possuem trechos de rio classificados como água salobra. A partir da metodologia de buscar usuários até 1 km dos trechos classe 3, foram identificados 96 usuários de irrigação para Navegantes e Itajaí nesta classe.

As águas salobras podem ser utilizadas na irrigação, porém apenas as águas classificadas como classe 1. Estas são permitidas para irrigação de hortaliças que são consumidas cruas e de frutas que se desenvolvam rentes ao solo e que sejam ingeridas cruas sem remoção de película, e à irrigação de parques, jardins, campos de esporte e lazer. A classe 3 salobra pode ser usada apenas para navegação e harmonia paisagística. Como os rios com água salobra possuem como meta manter a classe 3, todos os 96 usuários encontrados estão irregulares (Figura 5).

Para água salobra, apenas água classe 1 pode ser utilizada na aquicultura. No município de Itajaí foram identificados 69 usuários irregulares, e no município de Navegantes foram identificados 27, utilizando água classe 3 para aquicultura.

Considerações Finais

Utilizou-se como base de dados o Cadastro Estadual de Usuários de Recursos Hídricos (CEURH) de Santa Catarina e do sistema de outorga do Estado de Santa Catarina (SIOUT). Apesar de ser um banco de dados importante, o sistema apresenta fragilidades, como a localização dos pontos de captação indicando os empreendimentos e não os corpos de água, dificultando a gestão. É necessário um ajuste no sistema para identificar exatamente o ponto de captação.

Outro aspecto importante é a falta de identificação dos tipos de culturas irrigadas no CEURH e SIOUT, o que comprometeu parcialmente a identificação de usuários irregulares. Embora tenha sido possível identificar usuários em trechos de classe 2 e 3, a precisão quanto à regularidade depende do tipo de cultura. Essa informação é crucial para a gestão de recursos hídricos, especialmente com a aprovação do enquadramento na BHRI. Recomenda-se uma alteração no SIOUT-SC para que os usuários de irrigação preencham obrigatoriamente esta informação.

Foram identificados usuários de irrigação captando água em trechos de rio classe 3, uma classe restritiva devido à sua qualidade. A maioria das culturas predominantes na BHRI não pode ser irrigada com água de trechos classe 3, indicando um grande potencial de irregularidades. Para usuários em trechos classe 2, a classe é menos restritiva, mas ainda requer verificação, pois culturas permitidas apenas pela classe 1 (ex: morango, tomate) podem estar sendo irrigadas indevidamente.

A resolução CONAMA 357/05 estabelece que apenas classes 1 e 2 para água doce e classe 1 para água salobra podem ser usadas para aquicultura. Foram identificados usuários em desacordo com o enquadramento, que devem ser orientados a buscar outros pontos de captação, especialmente para água salobra, que não tem perspectiva de alteração de classe.

Agradecimentos

As autoras agradecem à FAPESC (termo de outorga nº, 2021TR1930) pelo auxílio financeiro ao projeto “Programa de efetivação do enquadramento da Bacia Hidrográfica do Rio Itajaí (BHRI) – metas propostas para 2025”.

Referências

(Opcional: Inclua as referências se achar pertinente para o seu blog. Geralmente, links para as fontes principais ou estudos podem ser mais adequados para um formato de blog do que uma lista completa de referências acadêmicas. As datas de acesso incompletas foram removidas ou completadas onde possível, assumindo o ano corrente se apenas dia e mês estavam presentes em um contexto de “acesso em”.)

  • ASSOCIAÇÃO DOS MUNICÍPIOS DO ALTO VALE DO ITAJAÍ – AMAVI. Perfil dos Municípios. 2022. Disponível em: https://www.amavi.org.br/municipios-associados/perfil. Acesso em: 2 fev de 2023.
  • CONSELHO ESTADUAL DE RECURSOS HÍDRICOS (CERH). Resolução CERH/SC n° 69, aprova o enquadramento dos corpos de água superficiais da UPG 7.1 – Itajaí em classes, segundo os usos preponderantes, e dá encaminhamentos, 24 de março de 2022. Florianópolis, 2022.
  • CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE (CONAMA). Resolução nº 357, dispõe sobre a classificação dos corpos de água e diretrizes ambientais para o seu enquadramento, bem como estabelece as condições e padrões de lançamento de efluentes, e dá outras providências, de 17 de março de 2005. Brasília, 2005.
  • PINHEIRO, A.; GIRARDI, R.; KNAESEL, K. M.; VENZON, P. T.; FAHT, G. Propostas de Metas Relativas às Alternativas de Enquadramento e Proposta de Efetivação do Enquadramento dos Corpos Hídricos Superficiais da Bacia Hidrográfica do Rio Itajaí. FURB. Blumenau – SC. 193 p.
  • PREFEITURA MUNICIPAL DE RIO DOS CEDROS. Portal de Turismo de Rio dos Cedros: A Cultura do Arroz Irrigado no Município. 2022. Disponível em: https://turismo.riodoscedros.sc.gov.br/o-que-fazer/item/a-cultura-do-arroz-irrigado-no-municipio Acesso em: 2 fev de 2023.
  • SERVIÇO DE APOIO ÀS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS DE SANTA CATARINA – SEBRAE. Caderno de desenvolvimento: Alfredo Wagner. 1. Estudos e Pesquisas. 2. Sebrae. I. Ferreira, Cláudio. II. Tonelli, Soraya, III. Pereira, Paulo Teixeira do Vale. IV Título. 2019.
  • SINDICATO DE HABITAÇÕES – SECOVI-SC. Convenções: Rio do Oeste. 2022. Disponível em: https://www.secovi-sc.com.br/convencao/convencao-99/. Acesso em: 2 fev de 2023.

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